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Netflix de roupas: uma saída para a moda sustentável

Foto do escritor: Giovana BragaGiovana Braga

Atualizado: 2 de jul. de 2020

Pioneiras do conceito no país, as gêmeas Patrícia e Natália Bello, de 32 anos, são criativas até na definição do seu negócio: “É tipo um netflix de roupa”. Para elas, essa é a ideia central da loja Entrenós, montada pela dupla em janeiro de 2020 em São Luís, no Maranhão. “É um guarda-roupa compartilhado, que funciona através de uma mensalidade, onde você paga e tem acesso a todo o nosso acervo”.


Antes mesmo da pandemia, elas já sabiam a necessidade de uma moda sustentável que não agredisse o planeta -e que ao mesmo tempo não perdesse o estilo da marca. A ideia de compartilhar roupa surgiu na Europa, é nova no Brasil e divide opiniões, mas em termos de sustentabilidade ela é uma saída com efeitos a curto e a longo prazo. - Para quem não faz parte do plano mensal, pode alugar de forma avulsa as peças do acervo - explicou Patrícia, que enfatizou que unir moda e sustentabilidade é uma questão urgente, tanto no Brasil como no resto do mundo. Sem contar que a peça, que pode ser usada por 7 dias, tem a lavagem por conta da loja.

foto: reprodução/Lucas Fonseca

No momento em que o mundo encara uma pandemia global, o setor da moda está repensando todos os seus aspectos por necessidade: seja pelo ritmo de produção, seja pela temporada de desfile, ou seja pela forma de consumir. Mas mais do que isso, o Brasil era o segundo maior gerador de primeiro emprego na área da moda, segundo a ABIT (Associação Brasileira de Indústria Têxtil), e também representa a maior cadeia têxtil completa da moda no hemisfério ocidental (significa que produz desde as fibras, a partir da plantação do algodão até os desfiles de moda propriamente ditos). Antes da covid-19, a indústria da moda gerava 1,5 milhão de empregos diretos e 8 milhões indiretos (sendo 75% composto por mulheres).


Construir uma moda justa e transparente, sem exploração e que gere empregos já era um desafio, mas com a agravação de uma pandemia global, virou um assunto urgente. Tratar o vestuário como serviço, e não como mercadoria, corresponde a uma parcela desse desafio, assim ressignificando o campo da moda, como elas contaram: “O nosso convite diário é que você se questione: “eu preciso de mais uma peça de roupa?” “De onde vem essa roupa?””. Mas para isso é preciso mobilização, coletividade, e principalmente esforços da sociedade civil, tanto no setor público quanto na iniciativa privada.


E é assim que Patrícia e Natália enxergam esse momento -elas que construíram a primeira loja de guarda-roupa compartilhado do Maranhão, e uma das 5 primeiras do Nordeste, nos contaram. “Tudo que é novo leva um tempo para ser aceito na sociedade. E com a gente tem sido um exercício diário de explicar como funciona, de falar nosso propósito”. Elas já sabiam que seria uma longa estrada criar algo novo, mas com a pandemia tiveram que se reinventar mais uma vez, agora mergulhando no mundo online, com vendas no Instagram, delivery e marketplace. Elas contam que as clientes aproveitam mais das roupas do “dia-a-dia” do que de roupas de festa, por exemplo, que antes era o mais comum. “Pra mim foi uma saída útil porque já não gostava de comprar roupa, e sempre pensava que estava gastando dinheiro a toa, já que prefiro variar nas roupas”, conta uma das primeiras clientes, Rafaela Pereira, de 32 anos.

foto: arquivo documentário/google.


A crise atingiu a moda e é essa a nova realidade que essa indústria terá que lidar. Valores capitalistas foram colocados em cheque, e acumulação e produtividade desenfreada são repensadas de forma acelerada. “Para esse momento de pandemia, encontramos algumas saídas: tínhamos lançado uma semana antes da quarentena o brechó e o marketplace, para vender produtos de produtores locais. E por conta desse momento de crise, a nossa aposta agora será nisso”, diz Patrícia Bello. As irmãs contam que para que haja uma moda inclusiva, é preciso compartilhar o seu espaço, e por isso o brechó online funciona com qualquer pessoa que tenha alguma peça que queira vender.


O impacto desse “novo normal” e as novas tendências de consumo -como por exemplo o guarda-roupa compartilhado- dialogam e propagam uma moda ecológica sem agredir o planeta. Segundo as gêmeas empreendedoras, a roupa mais sustentável é aquela que já existe, prolongando assim a vida útil e evitando mais danos ao planeta.

A moda sempre sofreu mudanças de acordo com as necessidades impostas pela sociedade. Desde mudanças locais até guerras globais ela se reinventa, e um clássico exemplo é a calça jeans feminina -que começou a ser usada na primeira guerra mundial. Foi ali, pela primeira vez que as mulheres deixaram as saias pesadas de lado e deram espaço a calça jeans, já que iriam ocupar postos de trabalho braçal -uma vez que os homens estavam indo para a guerra- e graças a isso, quase um século depois, a calça se tornou uma peça comum no guarda-roupa feminino.


No Brasil, o panorama da realidade da indústria da moda atual é retratado no documentário “Estou me guardando para quando o carnaval chegar”, feito pelo diretor Marcelo Gomes em julho de 2019, que mostra a cidade de Toritama, em Pernambuco, considerada um centro ativo do capitalismo local. É no interior do Nordeste que mais de 20 milhões de jeans são produzidos anualmente em fábricas caseiras, e que corresponde a 20% de todo o jeans do Brasil.


O documentário traz a tona uma discussão sobre trabalho autônomo, perda de direitos trabalhistas e a construção de uma nova relação com o tempo. Mostra trabalhadores que exercem atividades que demandam uso intensivo da mão de obra, que não requer estudo qualificado, e consequentemente com baixa remuneração e condições de trabalho precárias. Sem estrutura nenhuma, os proprietários das fábricas trabalham sem parar, numa escala de produção frenética -exceto no Carnaval, por isso o título do documentário-.


foto e edição: reprodução/Lucas Fonseca.


Quando se trata do futuro da moda, o primeiro combate é ao consumo exagerado e o incentivo a uma consciência que gere menos impactos socioambientais. O consumo desenfreado, considerado uma prática do passado, é e será substituído pelo consumo consciente, o que não é só mais uma questão de estilo de vida, mas também de sobrevivência no mercado. O guarda-roupa compartilhado é uma das primeiras portas na prática, que atende as necessidades dos consumidores e une com o propósito de um mundo ecologicamente sustentável.

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