top of page

Brasil é pioneiro no uso do Sistema Participativo para certificação de orgânicos

Nathalia Netis

Atualizado: 23 de jun. de 2020


Visita de Verificação de Conformidade Orgânica do Grupo Pinheiral Orgânico – ABIO - Fonte: Francis Alex Nunes

Criado por pequenos produtores, o Sistema Participativo de Garantia (SPG) está impulsionando a popularização da certificação de produtos orgânicos por não exigir tanta burocracia. O agrônomo Leandro Machado, que atua no Serviço de Defesa Agropecuária da Secretaria Estadual de Agricultura do Rio de Janeiro, explicou que esse método é mais simples do que o processo de Certificação por Auditoria por não exigir a presença de um auditor capacitado e totalmente disponível para a checagem de todo processo, o que encarece a certificação.


Nesse Sistema Participativo, de acordo com Leandro, há uma corresponsabilidade entre todos os produtores, que se organizam e avaliam mutuamente, com o objetivo de verificar o atendimento às leis e normas que regem todo o processo de produção ou de transformação dos alimentos orgânicos, tendo com isso um valor de adesão ao sistema bem inferior àquele cobrado por um processo de Certificação por Auditoria.


- O Sistema Participativo é algo genuíno no Brasil, uma 'jabuticaba'. Foi criado aqui. Já participei de alguns eventos com agricultores e pesquisadores de outros países, como da França, Chile etc., que vêm ao Brasil para conhecer e buscar maiores informações sobre nosso sistema - destacou Leandro - Hoje, os SPGs, como assim são usualmente conhecidos, estão sendo difundidos por muitas comunidades no mundo, por serem uma alternativa de Garantia da Conformidade Orgânica do produto de forma horizontal, ou seja, os produtores, consumidores e técnicos envolvidos têm plena responsabilidade para com o atendimento às normas da produção orgânica.


A biochefe Carol Barros, criadora do Instituto Bio, em Teresópolis, também acredita no Sistema Participativo como melhor forma para que o pequeno produtor possa obter seu certificado. Porém, por se tratar de um sistema de corresponsabilidade, há o risco da total confiança, uma vez que, segundo ela, se um produtor avaliar o outro de maneira errada, os dois perdem o direito ao selo.


- Eu acredito no Sistema Participativo como uma ótima forma de um pequeno produtor conseguir seu certificado de produto orgânico por ser mais em conta e menos burocrático. Mas, ainda assim, é um pouco perigoso por se tratar de uma relação onde eles mesmos se avaliam. Se um produtor errar na hora da avaliação do outro, os dois correm o risco de perder o selo da certificação. No Sistema Participativo é preciso confiar muito nas pessoas.


No sistema de produção orgânica, são usados um conjunto de técnicas e práticas para se produzir alimentos que seguem uma norma nacional. O marco legal no Brasil para ordenar e estruturar toda a produção orgânica foi instituído em dezembro de 2003, através da publicação da Lei Federal Nº10.831, que define e estabelece as condições obrigatórias para a produção e a comercialização de produtos da agricultura orgânica. É necessário que se respeite o meio ambiente, as relações trabalhistas e uma justa relação comercial.


Dentro de toda essa produção, há uma série de exigências e normas a serem seguidas, como: não praticar a queima do solo, a proibição do uso de agrotóxicos em qualquer das fases, desde a produção até a distribuição dos alimentos; o respeito às condições mínimas de vida dos animais e seus limites individuais para garantir seu bem-estar, entre muitas outras que visam garantir a oferta de um alimento de qualidade superior em todos os sentidos.


Para poder comercializar seu produto como orgânico e obter o selo do SISORG (Sistema Brasileiro de Avaliação de Conformidade Orgânica) um produtor deverá obter seus produtos orgânicos a partir de unidades de produção cadastradas e acompanhadas por organismos de avaliação da conformidade credenciados no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Dessa forma, a Garantia de Conformidade Orgânica pelo Sistema Participativo de Garantia dá ao pequeno produtor a chance de ter seu produto certificado e vendê-lo em todas as modalidades de comercialização do mercado de produtos orgânicos.


GARANTIA DA CONFORMIDADE ORGÂNICA


A certificação, em outras palavras, é a Avaliação da Conformidade Orgânica, ou seja, dizer se o produto é ou não é orgânico. Os procedimentos de Avaliação da Conformidade são quaisquer atividades usadas com o objetivo de determinar, direta ou indiretamente, que os requisitos regulamentados, aplicáveis a um produto ou serviço, estão sendo cumpridos na sua totalidade.


Para isso, o produtor orgânico, a fim de dar garantia aos clientes e consumidores sobre as qualidades orgânicas dos produtos e provar que segue todos os regulamentos técnicos da agricultura orgânica, precisa ser certificado em pelo menos um dos três tipos de Garantia da Conformidade Orgânica: a Certificação por Auditoria, o Sistema Participativo de Garantia e o Sistema de Auto Nomeação (sendo esse exclusivo para venda direta entre produtor e consumidor, não podendo haver nenhum ente intermediário, e também não poderá usar o selo do SISOrg, mas apenas uma declaração do Ministério da Agricultura que o produtor atende aos requisitos e padrões de produção exigidos pela legislação dos orgânicos).


Na Certificação por Auditoria, sempre deverá haver a presença do auditor, ou seja, o representante capacitado da certificadora credenciada pelo Ministério da agricultura que deverá ir até a propriedade orgânica, e auditar todo o processo praticado por aquele produtor até a obtenção do seu produto. E, só então, ao final da inspeção, ele poderá (não sendo observadas “não conformidades”) autorizar a emissão do certificado pela empresa certificadora. Tal forma de certificação, acompanha as normas internacionais baseadas na ISO (Organização Internacional de Normalização).


Considerando as peculiaridades e exigências desse processo de certificação, milhares de agricultores familiares não são capazes de participar deste método de garantia, acabando por serem excluídos do processo, principalmente em razão do custo praticado pelas certificadoras que é inviável para muitos destes pequenos produtores.

Diante disso, surgiu no Rio Grande do Sul, as primeiras iniciativas de certificação participativa, como uma forma de protesto e resistência à regulamentação de produtos orgânicos pela Certificação por Auditoria.


Na certificação pelo Sistema Participativo, não há a figura do auditor. Logo, o produtor precisa se filiar à uma OPAC (Organismo Participativo de Avaliação da Conformidade Orgânica) já credenciada junto ao Ministério da Agricultura e, por ser participativa, ele deve se envolver em todos os eventos daquele grupo, respeitando seus direitos e obrigações como integrante. Segundo Leandro Machado, o produtor deve pagar uma mensalidade, que gira em torno de R$ 70,00 a R$ 100,00 por mês, variando conforme a classificação do agricultor; além de custos relativos à sua adesão ao sistema e da primeira Visita de Verificação à sua unidade de produção.


O custo fica em torno de R$ 250,00. Logo, para esses pequenos produtores, esse tipo de certificação é muito mais atrativo, carecendo, contudo, de grande responsabilidade solidária ao grupo da OPAC. Por isso a avaliação da conformidade pelo Sistema Participativo vem ganhando espaço no Brasil e no mundo.


Segundo Leandro, quem sai ganhando é o consumidor, que passa a ter uma referência oferecida pelos próprios produtores na hora de fazer as suas escolhas. Ao mesmo tempo, também ganha ao consumir um produto certificado, uma vez que este causa menos impacto no meio ambiente e em sua própria saúde.

- Independente da forma pela qual o alimento recebeu o selo de orgânico, o consumidor ganha, pois está consumindo um produto que passou por um processo de produção que se considera como o que causa o menor impacto para o ambiente, para a sociedade e para a saúde humana. Esse é o primeiro motivo e acredito que seja o mais importante. Mas, se considerarmos que o processo de Avaliação da Conformidade por SPG é muito mais próximo da realidade econômica dos pequenos produtores, isso resulta em dois resultados. O primeiro é uma incidência menor do peso deste processo no custo final do produto orgânico, e ainda, havendo um custo menor e uma maior facilidade para a obtenção do selo; então passamos a ter uma maior oferta e redução dos preços finais para o consumidor.


O FUNCIONAMENTO DO SPG - ABIO


A ABIO - Associação de Agricultores Biológicos do Estado do Rio de janeiro – utiliza o Sistema Participativo de Garantia (SPG-ABIO) como forma de certificar um produto orgânico. Segundo o facilitador Francis Alex Nunes, a associação é subdividida em grupos para que se facilite o trabalho de inspeção.


De acordo com ele, que é facilitador de três grupos (Pinheiral Orgânico, Barra Mansa e Seiva), as reuniões ocorrem mensalmente com os grupos mais próximos da propriedade do produtor, para avaliar a produção. O interessado, segundo Francis, deve participar dessas reuniões e acompanhar as Visitas de Verificação para que obtenha as informações de como são feitas.


Uma vez aprovada a produção, há visita de agricultores, visita de reavaliação, várias atividades durante o mês que precisam ser feitas pelo produtor. Caso ele não tenha um número específico de visitas ou de atividades necessárias, é excluído do grupo.


- A primeira coisa que o produtor precisa fazer quando quiser certificar um produto pela ABIO, é elaborar um Plano de Manejo Orgânico (que deve ser renovado todo ano), um documento onde se escreve todo o seu sistema produtivo; apresentar para o grupo em uma reunião mensal e então o grupo avalia - explicou Francis - Se ele for aprovado, no mesmo dia é agendada uma Visita de Verificação. Vão três produtores já verificados e o facilitador do grupo para a fiscalização junto ao produtor para ver se tudo está dentro da conformidade. Após todo esse processo, o grupo inteiro aprova ou não a produção.


Vale ressaltar que o Sistema Participativo aplica o mesmo status de Certificação por Auditoria, sendo a única diferença, um preço acessível às pequenas famílias e produtores orgânicos, e menos burocracia para se obter o selo.

Por exemplo, o Sítio do Moinho, no Rio de Janeiro, é uma empresa de orgânicos certificada pelo Instituto Biodinâmico (IBD), especializado em auditoria. É pago um valor anual a cada projeto que é desenvolvido. O certificado da horta orgânica custa R$ 6 mil por ano, a panificadora orgânica R$ 8 mil por ano e o processamento dos legumes R$12 mil por ano. Segundo Carol Barros, no Sistema Participativo, a mensalidade não está vinculada à produção.

Reunião mensal do Grupo Barra Mansa - Apresentação do Plano de Manejo Orgânico - Fonte: Francis Alex Nunes

90 visualizações0 comentário

Comments


bottom of page